Conflito de interesses e mudanças nos termos de contrato no meio dos processos seriam algumas das “transgressões” da entidade
Uma auditoria externa feita na Organização Mundial da Saúde (OMS) apontou que a entidade tem sérias falhas administrativas e “transgressões” em contratos firmados com cifras de milhões de dólares. Nas irregularidades estariam acordos para comprar máscaras, luvas e material de proteção que seriam enviados aos países mais pobres do mundo em 2020, em razão da pandemia de Covid-19.
Apesar de não haver referências à corrupção ou a desvios de verbas, o relatório aponta que existem transgressões, tais como alterações nos critérios de licitações no meio do processo, conflito de interesse e operações de compra feitas quatro meses antes de contratos terem sido formalizados.
A nova auditoria também aponta para a existência várias transgressões na seleção e contratação de uma empresa de consultoria que estava ajudando a OMS na aquisição de equipamentos de proteção individual, sem a devida aprovação, embora isso implicasse o pagamento de 2,53 milhões de dólares (R$ 12,77 milhões).
Cobrada pelos auditores sobre as transgressões cometidas, a OMS disse que as medidas tomadas tinham como objetivo garantir o abastecimento de países que passavam por necessidades. A entidade, porém, indicou que está revendo seus processos e que está aprimorando suas operações.
A análise observou ainda “deficiências nas garantias de qualidade e avaliação técnica na aquisição emergencial de equipamentos de proteção”, bem como que a aquisição dos kits de teste da Covid-19 teve uma “falta de objetividade na avaliação das propostas e na seleção dos fornecedores”.
Com esses pontos, a auditoria conclui que “o sistema de aquisição sofreu com a documentação inadequada e a falta de avaliação de desempenho do fornecedor”.
CONSULTORIA COMEÇOU A TRABALHAR SEM APROVAÇÃO
Oito contratos com um valor total de 11,72 milhões de dólares (R$ 59,1 milhões) foram firmados com uma empresa, a “consultoria A”, cujo nome oficial não foi revelado pela auditoria. Dois contratos num alto valor, um total de 5,4 milhões (R$ 27,2 milhões), foram selecionados para um exame detalhado.
O objetivo da “consultoria A” seria ajudar a OMS a desenvolver suas capacidades de gerenciamento da cadeia de abastecimento na pandemia. Mas os auditores ressaltaram que “a natureza do trabalho realizado por ‘A’ em todas as fases foi a mesma, o que incluiu a produção regular de previsões de fornecimento”.
Uma das tarefas declaradas pelo Consultor A foi a identificação dos fornecedores de equipamentos de proteção. Entretanto, durante o mesmo período, em 5 de maio de 2020, a OMS havia assinado uma Carta de Intenções com a firma C, para ajudar na aquisição e compra de equipamentos, o que indicaria que o “Consultor A” começou a trabalhar sem aprovação.
– Observamos que o Consultor A foi contratado e começou a trabalhar sem a devida aprovação, apesar de implicar o pagamento de 2,53 milhões de dólares (R$ 12,77 milhões) pela OMS. A proposta para aprovação foi iniciada quase quatro meses depois que o Consultor A começou seu trabalho e depois que três das quatro fases foram concluídas – diz o relatório.
MUDANÇAS NAS LICITAÇÕES NO MEIO DO PROCESSO
A revisão dos contratos também apontou questões sobre o processo de seleção da “Consultoria A”. No processo de licitação, duas empresas foram selecionadas para a fase final. Mas a que obteve o maior número de pontos não ficou com o contrato.
– O consultor D obteve a maior pontuação total; portanto, a consultoria deveria ter sido concedida à Consultora D. Entretanto, a OMS alterou os critérios de avaliação e reavaliou as propostas de acordo. Isso permitiu que Consultora A obtivesse uma pontuação mais alta e o contrato foi concedido à consultoria – diz a auditoria.
A justificativa dada pela OMS foi que o Consultor D, em sua proposta financeira, havia apenas estimado um custo preliminar. Já o Consultor A tinha licitado de forma abrangente. Mesmo assim, os auditores concluíram que “a justificativa e avaliação das propostas não estavam em conformidade com as disposições do Manual de Compras da OMS e violava as normas de compras públicas”.
CONFLITO DE INTERESSES EM CONTRATOS
As “transgressões” também foram encontradas em outros pontos do processo. Os auditores observaram que o Consultor A estava envolvido na preparação dos documentos de licitação e tinha dado contribuições à gerência sênior da OMS.
– O envolvimento do Consultor A no processo de aquisição, no qual a própria empresa foi licitante, é um conflito de interesses – constata a auditoria
Além disso, ao mesmo tempo que a consultoria contratada prestava assistência à OMS, ela também negociava com os fornecedores. Foram identificadas ainda “deficiências” na aquisição de suprimentos e materiais médicos.
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